Por Romero Rodrigues: Fundador e principal executivo do Buscapé Company.
Quando começamos nossa jornada empreendedora na Internet, há mais de 15 anos, eu e meus sócios, na ocasião quatro jovens universitários, tínhamos um sonho: inverter a lógica do mercado, dando maior poder ao consumidor para pesquisar e comparar preços com uma ferramenta de busca capaz de promover a livre concorrência e de deixar mais transparente quais as melhores ofertas disponíveis no comércio eletrônico.
Imaginávamos que com o crescimento do varejo on-line, chegaria o dia em que não somente os grandes players teriam condições de disputar a atenção do consumidor, mas também os pequenos lojistas estariam aptos a concorrer e crescer dentro de um ambiente consideravelmente mais acessível e democrático do que o varejo tradicional.
Nosso sonho foi realizado. Hoje, o Buscapé reúne um universo de mais de 30 mil lojas em seu mecanismo de busca, que oferecem mais de 15 milhões de itens diferentes e atraem cerca de 60 milhões de visitantes únicos todos os meses interessados em encontrar e fechar o melhor negócio. Seguindo a premissa da economia de mercado, construímos um buscador que naturalmente forçou o varejo a ser mais competitivo e a evoluir para um atendimento cada vez mais customizado e alinhado com os desejos dos consumidores.
Há alguns dias, recebemos uma notícia que renovou nossas esperanças de garantirmos um futuro para o e-commerce dentro de um ambiente saudável e propício para estimular a competitividade em benefício dos consumidores. A Comissária de Competição da União Europeia, Margrethe Vestager, reconheceu que o Google usa sua posição dominante para promover seus próprios serviços e tornar mercados viáveis, especialmente o Google Shopping. A acusação formal pode resultar em uma multa de 6 bilhões de euros contra a empresa americana, que tem algumas semanas para responder a acusação antes do veredicto da UE.
Para que o leitor possa entender o que significa esta ameaça monopolista, imagine que, antes de sair às compras, o consumidor faça uma pesquisa na Internet para encontrar a melhor oferta. Mas ao invés de contar com um buscador neutro, que lista resultados mais baratos e adequados ao que busca o consumidor, receberá em destaque somente as sugestões de ofertas que atendam aos interesses comerciais do próprio buscador, no caso o Google Shopping. Não é difícil imaginar como esta concentração será nociva aos próprios consumidores, que aos poucos se tornam reféns de todo e qualquer serviço oferecido pelo Google.
É indiscutível a importância dos sites de busca para uma melhor experiência na Internet. Eles sempre foram e continuarão sendo a porta de entrada da Web, inclusive para quem está pesquisando e comparando produtos e serviços. Mas a forte predominância internacional de um único player no mercado de buscas vem se apresentando como uma barreira à livre concorrência. No Brasil, o Google responde por quase 100% das buscas feitas na rede. Além disso, tem as chaves de outras duas portas de entrada na Internet: o navegador Chrome e o sistema operacional Android, reforçando ainda mais seu monopólio e a possibilidade de manipular os resultados de busca, confundindo os consumidores, que, ao acessarem os primeiros links listados, estarão certos de que aquelas seriam, de fato, as melhores ofertas disponíveis na rede.
Ledo engano. Como a grande maioria dos usuários sempre clica em um dos três primeiros links dos resultados de busca, fica marcada a deslealdade com concorrentes e consumidores, trazendo a urgência de defender a isonomia com regulamentação que venha garantir uma neutralidade nas buscas.